domingo, 15 de setembro de 2013

Em Porto Alegre, Bienal do Mercosul quer 'geografia crua'

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Compartilhado da Folha de São Paulo  por 
SILAS MARTÍ
DE SÃO PAULO

Um emaranhado de cabides metálicos pende do teto na forma de uma antena. No chão, uma rede de mangueiras transparentes faz circular litros de água, da mesma maneira que faz um coração de verdade com o sangue.
Esse desejo de transcender a geografia, no caso do transmissor criado pela dupla de artistas Allora & Calzadilla, e o de transformar em processo plástico um fenômeno tão natural quanto a circulação do sangue, peça do alemão Hans Haacke, são as duas pontas do espectro de obras na atual Bienal do Mercosul.
Batizada com o nome de um tratado comercial de fronteiras bem definidas, a exposição que começa na quarta-feira (11) em Porto Alegre tem como meta questionar e investigar essa cartografia já estabelecida.

Bienal do Mercosul

Eduardo Seidl/Divulgação/Índicefoto
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'Circulation', obra do artista Hans Haacke, refeita para Bienal do Mercosul em Porto Alegre
Desta vez são dois os deslocamentos. A mostra deixa de ocupar os armazéns no cais do lago Guaíba, agora em reforma, e se espalha pela cidade --do Santander Cultural à Usina do Gasômetro.
Suas obras também refutam a mera representação da natureza para extrair de fenômenos naturais, ou melhor, do embate entre artista e natureza, uma plástica menos espetacular e mais intangível, como ondas de rádio.
"Não estamos falando mais de fronteiras", diz Sofía Hernández Chong Cuy, curadora mexicana à frente desta nona edição da mostra. "A geografia que estamos explorando é a do espaço cru, do mar e dos subsolos da terra."
Um tanto vaga, Chong Cuy parece querer usar as linhas de transmissão das antenas para unir pontos tão distantes como um hotel arrasado por um furacão no Caribe --foco da obra do artista mexicano Mario García Torres-- e um campo de meteoritos na Argentina --assunto da dupla Faivovich & Goldberg.
PORTAIS DO TEMPO
"Tem mais a ver com tempo do que com espaço", diz a curadora. "São trabalhos que vejo como portais para outras épocas históricas ou como imaginações atmosféricas."
Imaginações à parte, o que a mostra tem de concreto são remontagens de alguns trabalhos clássicos, talvez daí essa tal ponte com o tempo.
Hans Haacke, que montou suas veias e artérias de plástico pela primeira vez em 1966, vê ressurgir o trabalho.
"Não pensei em termos simbólicos com essa circulação. São processos em que percebia uma beleza tradicional", diz o alemão à Folha. "Mas entendo que uma obra nunca é vista da mesma maneira em épocas distintas."
Marta Minujín, artista argentina pioneira em performances no cenário latino, também aposta na releitura de uma ação dos anos 1960, quando ficou 24 horas em comunicação ininterrupta com outros dois artistas na Alemanha e nos Estados Unidos.
Em Porto Alegre, Minujín deve refazer a performance em escala menor. "A ideia era a simultaneidade, a globalização de tudo, que é o que ocorre agora", resume. "Queria fazer dos meios de comunicação de massa uma obra."
Mas não são só reconstruções do passado. Peças clássicas também serviram de gatilho a novas produções.
Uma canção de Caetano Veloso criada em 1971 ganhou um cover na voz do mexicano Mario García Torres. "If You Hold a Stone", que fala do poder de cura de uma pedra, vira um mantra etéreo nessa mostra com pretensões de reinventar a natureza.
"É uma reinterpretação", diz García Torres. "Minha obra fala da relação que tenho com essa outra, que foi criada tantos anos atrás."
9ª BIENAL DO MERCOSUL
QUANDO quarta-feira (11), às 9h (convidados); qui., às 19h (público); de ter. a dom., das 9h às 19h; até 10/11
ONDE vários endereços (veja em bienalmercosul.art.br )
QUANTO grátis